Contos do Deserto: as histórias da tradição oral sufi à luz da Psicologia Analítica

Contos do Deserto: as histórias da tradição oral sufi à luz da Psicologia Analítica

Contos do Deserto: as histórias da tradição oral sufi à luz da Psicologia Analítica

Tales from the Desert: the stories of the Sufi oral tradition in the light of Analytical Psychology

Raquel Trindade Andrade¹

Resumo: Este trabalho aborda a temática dos contos de tradição oral, em especial sua função na tradição Sufi. O objetivo é lançar um olhar sobre os chamados contos de ensinamento pela ótica junguiana. O problema levantado é oriundo da seguinte pergunta: Os contos de ensinamento da tradição Sufi podem ser utilizados como recurso terapêutico na perspectiva da Psicologia Analítica? O estudo investiga a questão a partir do quadro teórico e conceitual dessa perspectiva, especificamente em referência às obras de Jung e Von Franz que abordam a temática dos contos de fadas. A referência utilizada não se furta ao diálogo com alguns autores que se relacionam com o campo da arte-educação e com a perspectiva sufista sob a ótica de Idries Shah. Os procedimentos metodológicos utilizados são a pesquisa bibliográfica e documental. Em conclusão, afirma-se que os contos de ensinamento da tradição Sufi são um importante recurso terapêutico, porque possibilitam o que Jung denomina de “função transcendente”. Os símbolos presentes na narrativa podem mediar o diálogo entre o consciente e o inconsciente, podendo proporcionar outros estados de consciência, por meio de uma saída criativa para a problemática pessoal.

Abstract: This work addresses the theme of tales of oral tradition, in particular their function in the Sufi Tradition. The aim is to look at the so-called teaching tales from a Jungian perspective. The problem raised comes from the following question: can the teaching tales of the Sufi Tradition be used as a therapeutic resource from the perspective of analytical psychology? The study investigates the issue from the theoretical and conceptual framework of Jungian Psychology, specifically in reference to the works of Jung and Von Franz that address the theme of fairy tales. The reference used does not shy away from the dialogue with some authors who are related to the field of art education and the Sufi perspective from the perspective of Idries Shah. The methodological procedures used are bibliographical and documentary research. In conclusion, it is stated that the teaching tales of the Sufi Tradition are an important therapeutic resource, because they enable what Jung calls the “transcendent function”. The symbols present in the narrative can mediate the dialogue between the conscious and the unconscious, and can provide other states of consciousness, through a creative way out of personal problems. 

¹ Assistente Social, arteterapeuta, escritora. Assistente social pela UERJ; pós graduada em Serviço Social e
Saúde; mestre em Políticas Públicas e Formação Humana – PPFH/UERJ; arteterapeuta pelo INCORPORAR-TE;
especialista em Psicologia Analítica pelo IJEP. Arteterapeuta filiada à AARJ – 1154/122. Lattes aqui

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Por que eu me sinto um patinho feio?

Por que eu me sinto um patinho feio?

Conta a história, que o Patinho Feio depois de um doloroso caminho, se descobre um lindo cisne e isso repara todo o sentimento de rejeição e abandono vivido até então. O conto escrito por Hans Christian Andersen termina aí, deixando uma das seguintes mensagens: “saber sua identidade e se reconhecer em seus semelhantes muda toda a história”. 

De 1843 para cá, ano de publicação do conto, a mensagem permanece potente e continua a atrair, como um imã, a atenção de muitas crianças. Do mesmo modo, se preserva, ainda hoje, na memória de adultos de diferentes contextos sociais e culturais.

Sem dúvida, podemos nos perguntar se em algum momento de nossas vidas também nos sentimos um patinho feio. E a história da humanidade, com toda certeza, cria e recria muitos mecanismos de exclusão, que reafirmam essa imagem tão sombria.

Me recordo nitidamente da primeira vez que ouvi o conto, eu devia ter uns cinco anos de idade e, mesmo sendo tão pequena, lembro com assombrosa nitidez que chorei um choro de uma profunda tristeza, tal foi o impacto do Patinho Feio. De lá para cá, por vezes até o início da juventude, me senti vestida das plumas desse pato que se sentia tão inadequado. Saber que o pato era um lindo cisne, nem sempre me acalentou, mas com certeza, me encheu de esperança. 

Agora, vamos analisar, de forma breve e acessível, alguns aspectos da estrutura deste conto. Neste ponto, é importante destacar que estamos abordando o conto original. Outro aspecto importante é que este texto é uma analisa simbólica sobre o conto, a partir da perspectiva da Psicologia Analítica. 

Ilustração do livro O Cisne e o Espelho

Inicialmente, analiso que toda a primeira parte da estrutura do conto apresenta a manifestação do sentimento de rejeição e, a potencialização desse sentimento, por meio das figuras materna e paterna. A mãe do patinho, choca o ovo, mas não sustenta para si e para os demais que ele seja diferente, de modo que ele está sempre se sentindo como um ser estranho, inadequado. Já o pai, é mencionado como ausente, a mãe do Patinho, logo de início se queixa sobre o abandono paterno. A partir daí, se configura um “Patinho feio” que interpreta o mundo a partir do sentimento de inadequação e rejeição.

Em seguida, podemos observar que o Patinho percebe todos os animais do quintal e também seus irmãos de forma agressiva e discriminatória. A pata mais nobre do quintal reforça o complexo materno do herói da história, na medida em que ela coloca uma condição de adequação para que ele fosse aceito naquele grupo. A pata mais nobre, assim como outros personagens que seguirão, manifestam e reforçam o sentimento de rejeição que o patinho trazia com ele. 

O primeiro cenário após o nascimento dos ovos é a inserção no lago. O lago remete ao paraíso da relação primal, ou seja, a relação mãe e filho. Segundo Neumann (1995) o caráter de Eros da relação primal, como se refere a um processo anterior à formação do ego, manifesta-se cósmica e transpessoalmente, e não de forma pessoal. “É por isso que o Paraíso, o Lar Original, o Círculo, o Oceano ou o Lago, figuram entre os símbolos do passado remoto. Estar contido nesse mundo cósmico é uma expressão da forma embrionária de existência anterior ao ego” (NEUMANN,1995; p. 15).

Além dos arquétipos maternos e paternos, surge nesse primeiro momento a figura dos irmãos. O patinho não percebe os irmãos como companheiros, amigo ou herói. Não estabelece com eles um sentimento de irmandade, pelo contrário, sente-os maus e rivais. Desse modo, o patinho além de não estruturar sua identidade também carrega consigo dificuldades na alteridade, no relacionamento com os outros ou em estabelecer relações de companheirismo.

Erich Neumann (1995) fala sobre o comportamento narcísico da criança ferida. Segundo o autor, para que a criança consiga estabelecer relações de afeto saudáveis com outras pessoas ela precisa ter recebido o bastante. Neumann explica que para crescer, para amadurecer, para se desenvolver psiquicamente, para se separar da fusão com a mãe, é preciso ainda ter recebido o bastante, sido alimentado, tocado, acariciado, amamentado e, sobretudo, ter sido amado o suficiente. Com efeito, o ser humano não aceita abandonar, aceitar a perda para seguir adiante, a menos que tenha passado pela experiência dessa etapa; do contrário, o psiquismo procura voltar a esse impossível paraíso perdido, tende a regredir para situações de falta ou situações traumáticas.

Dando sequência a narrativa do conto, analiso que: não sendo mais suportável para o patinho todo aquele sofrimento, ele  foge do quintal com os poucos recursos internos que dispunha. O pular a cerca se inicia com um ato de fuga. A fuga é uma atitude instintiva muito presente no processo de individuação do patinho. Em vários outros momentos da história, ele foge. Podemos considerar esse movimento como parte de um instinto de sobrevivência, e, portanto, ainda que limitado, de preservação da vida.

Segundo Fraisse (2006) a etapa dos primeiros anos do desenvolvimento psíquico da criança é caracterizada pela diferenciação entre o eu e o outro, ou seja, seria a percepção de que minha necessidade foi atendida e saciada e “o eu não é o outro que me alimenta”. Como o patinho sofre com uma desestruturação em toda essa fase inicial da vida, não é claro para ele essa diferença.

Diante de tanto caos psíquico, o patinho vive uma constante fuga e, busca, inconscientemente, superar esse estado de fusionamento e conhecer sua verdadeira forma. Nessa jornada, até chegar ao conhecimento da sua identidade, ele vai percebendo aquilo que ele não é. Dito de outro modo: ele vive em fuga e em busca de si mesmo.

Como esse texto precisa ser mais objetivo, vamos literalmente pular para o final do conto. O Patinho, finalmente encontra e se reconhece um cisne, ou melhor um lindo cisne. Podemos analisar, que, simbolicamente, ele reconhece sua identidade no espelho d’água e, renasce. É nas águas que o outrora patinho, agora cisne se reconhece. Neste ponto o herói finalmente ganha forma e se percebe como igual aos demais da sua espécie. Temos aqui dois símbolos importantes, o espelho e a água.

Narcíso é o personagem da mitologia grega que se apaixona pela própria imagem. O patinho repete o movimento de Narciso, e se olha no espelho da água, mas ao contrário daquele, não afunda em si mesmo. Ele precisava dá a si mesmo o olhar narcísico materno e faz isso sem se perder na própria imagem, ao contrário do personagem mítico Narcíso. O patinho aprende a se auto nutrir, ou seja, a dar para si o olhar atento e cuidadoso. É esse olhar da função materna (estou me referindo a função e não necessariamente a mãe biológica) que dá tônus para a sensação de encarnação da própria existência. 

Um sentimento tão potencialmente danoso como o da rejeição, uma vez vivido, pode retornar de formas fantasmagóricas ao longo da vida. Portanto, essa história, alerta sobre a importância de observar esses fantasmas, muitas vezes originados em épocas tão remotas de nossas vidas. 

Por esta razão, deixo uma provação sobre a importância do auto amor. Pois, não importa quantas vezes o reflexo sombrio do patinho feio apareça diante de nós, como uma sub identidade, em todas essas vezes, precisaremos sempre nos olhar com reconhecimento e apreço e, nos lembrar, da importância dos vínculos saudáveis de identificação.

“Lutar contra as feridas da alma, pode acarretar no aumento da dor. O convite que deixo neste artigo, é dialogar com coragem, presença e respeito. Quem sabe, assim, possamos reabilitar de um modo mais genuíno, nossa auto imagem”.

Nesse caminho, a arteterapia e a psicoterapia podem ser o espaço de construção desse diálogo interno, tão especial e importante.

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A Finalidade  da Terapia com Recursos Artísticos

A Finalidade da Terapia com Recursos Artísticos

Uma das abordagens que utilizo no atendimento clínico é a Arteterapia. Você pode se perguntar qual seria a utilidade ou em que agregaria uma psicoterapia baseada em recursos artísticos e expressivos.

Você pode imaginar que o melhor seria um método convencional, baseado apenas no recurso narrativo por meio da fala, e que não haveria razões lógicas para se dispor ao desconforto de experimentar outras formas de expressão. Afinal, para que você se daria a este trabalho, se a fala já é o recurso habitual e comumente utilizado nesses processos.

O que é desconhecido ou inabitual pode gerar desconforto sim, mas também pode gerar resultados diferentes daqueles já identificados. Sair da zona de conforto pode ser desafiador, mas também mais rico, afinal, no mínimo você irar experienciar outras possibilidades criativas e expressivas.

Pensando nessas questões, eu listei abaixo quatro finalidades dos recursos expressivos.


Vamos a pergunta: Para que serve terapia com recursos artísticos e expressivos?

Para expressar sua narrativa, sentimentos e emoções por meio de uma linguagem mais fluída, espontânea e criativa;

Para se escutar para além do que é possível falar e pensar a respeito de si. Por meio de técnicas expressivas e artísticas é possível chegar em outras camadas de autopercepção;

Para se abrir para possibilidades mais criativas de compreensão e, com isso, estimular o seu potencial criativo de ação;

Para trazer para fora, dando uma forma, àquilo que está dentro, no espaço interno. Se esse sentimento ou situação ganha uma forma, é possível estabelecer um diálogo com esta forma/sentimento/situação.

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Existe a tal criança interior?

Existe a tal criança interior?

A Psicologia Analítica considera que há o aspecto psíquico da criança em nós. Ou seja, os sentimentos, pensamentos e necessidades da criança que fomos podem permanecer como um núcleo afetivo e influenciar as atitudes do adulto.

Erich Neuman fala que para crescer, para amadurecer, para se desenvolver psiquicamente, para se separar da fusão com a mãe, é preciso ainda ter recebido o bastante, sido alimentado, tocado, acariciado, amamentado e, sobretudo, ter sido amado o suficiente. Do contrário, o psiquismo procura voltar a esse impossível paraíso perdido, tende a regredir para situações de falta ou situações traumáticas.

É por isso que na psicoterapia é importante observar a origem de determinados comportamentos. Contudo, conhecer a origem não é o bastante, é necessário que o adulto repare a própria história e que, em seu processo, vá integrando todo o conteúdo advindo da infância.

Mas como isso é possível? Dialogando com esta “criança” no contato consigo mesmo e no processo psicoterapêutico. Compreendendo quais foram suas necessidades supridas ou reprimidas. Quais as dores, traumas, reconhecendo e acolhendo o que tiver que vir. É importante entrar em contato para sentir quais os potenciais “essa criança” podem despertar no adulto hoje.

Após esse movimento, podemos nos voltar para o adulto e, assim, obter um olhar mais maduro e próprio sobre os conteúdos da criança.

No aspecto psíquico da criança que fomos, não entramos em contato somente com sentimentos dolorosos como abandono. Todxs nós podemos encontrar qualidades tais como criatividade, espontaneidade, leveza e habilidades.

Referências: Neumann, Erich. A Criança: Estrutura e Dinâmica da Personalidade em Desenvolvimento desde o Início de sua Formação. Editora Cultrix: São Paulo, 1995.

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